O cancioneiro popular do Baixo-Alentejo traduz–se nas modas do cante alentejano.
O cante (é assim que se diz por estas bandas do sul) e as suas modas (as cantigas do cante), constituem uma expressão telúrica da alma do povo do Baixo-Alentejo.
O cante alentejano (expressão cultural caraterizadora e identitária da região do Baixo-Alentejo) tem particular ênfase em Ferreira do Alentejo, que se localiza justamente no coração desta região.
Texto: Luís Pita Ameixa Fotos. Luís Calado
A UNESCO classificou, em 2014, esta expressão etnomusical como património cultural imaterial da humanidade (Decision of the Intergovernmental Committee: 9.COM 10.35).
O território de Ferreira do Alentejo é dos que regista maior número de grupos corais alentejanos, genuínos, sendo de destacar o surgimento recente de novos grupos, constituídos por jovens, facto de grande alcance para a preservação desta forma artística popular.
Não obstante, o que importa relevar é que esta expressão cultural se encontra viva no seio do povo e, por isso – além dos grupos corais organizados, que fazem as suas atuações em locais e eventos próprios, aliás, frequentes na região – não será raro, para quem visita estas terras, passar numa rua e ouvir o cante, oriundo de um grupo de homens que convive entre si, mais habitualmente numa taberna onde, ao fim da tarde, acompanha um saboroso petisco com um copinho de vinho branco, e, juntos, cantam.
Os alentejanos cantam sempre juntos, em grupo.
Quem ficou muito impressionado com o cante foi o grande etnomusicólogo, Michel Giacometti (de Ajaccio, Córsega), que recolheu muitas gravações e informações sobre o mesmo e lhe dedicou tanto do seu estudo num trabalho reconhecido de grande importância.
Este corso, por vontade própria de alto significado, veio a ser sepultado no cemitério de Peroguarda, uma pequena aldeia de Ferreira do Alentejo, de grandes tradições culturais, forte tipicidade e que foi galardoada como a aldeia mais portuguesa do Baixo-Alentejo, em 1938, em concurso nacional promovido então pelo SPN.
Visitar o mausoléu de Giacometti e ouvir o puro cante alentejano, justifica bem uma visita a estas terras.
O cante tem as suas modas tradicionais mas em cada terra pode ter as suas especificidades. No caso de Ferreira do Alentejo, com o seu modo próprio de cantar, pode ser ouvida uma moda local, que rima assim:
Ferreira do Alentejo
tens umas áreas tão boas
tens um lindo entroncamento
Algarve, Beja, Lisboa
Justamente é a localização geográfica aliada à qualidade das terras que, ao longo da história, fizeram de Ferreira do Alentejo um sítio importante.
No sul, Ferreira do Alentejo é absolutamente central.
Ferreira do Alentejo é agora servida por autoestrada, encontrando-se a cerca de hora e meia da capital do País, Lisboa; a duas dezenas de quilómetros da cidade capital do Baixo-Alentejo, Beja, com o seu aeroporto nascente a par de rico património histórico; a uma hora da costa alentejana com as suas belas praias, de Almograve e Milfontes a Comporta e a Tróia, onde pontifica o maior porto de mar de Portugal (Sines); a pouco mais de uma hora do Algarve, e o mesmo de Espanha, com acesso privilegiado a uma grande cidade como Sevilha apenas a três horas de automóvel a partir de Ferreira do Alentejo.
Ferreira do Alentejo é também um território com água.
Justifica-se uma visita ao rio sado que banha a povoação de Santa Margarida do Sado, pescar no rio, saborear a zona verde ribeirinha e um almoço de enguias em qualquer restaurante, ou visitar Odivelas, outra aldeia deste território mas com caraterísticas muito diferentes, construída num serro do relevo, aqui mais agreste, bem servida de hotelaria moderna e confortável e bem próximo da albufeira de Odivelas, um extraordinário plano de água com uma agradável zona de lazer fluvial e um parque de campismo de qualidade.
No território de Ferreira do Alentejo existem hoje 17 unidades de alojamento turístico que respondem com qualidade às exigências dos visitantes e pode ainda beneficiar-se de acompanhamento personalizado para visitas organizadas.
No SITE do município podem ser encontradas informações úteis.
Numa visita a Ferreira do Alentejo, a gastronomia estará num plano central. A arte culinária do Baixo-Alentejo, muito à base de pão e ervas do campo, deixa as melhores referências a quem prove, por exemplo, uma açorda de beldroegas ou uns típicos bolos ferreirenses.
O vinho é aqui excelente, mormente o branco, pois é este, e não outro, o da tradição destas terras.
Da terra vêm os produtos e a agricultura é aqui uma rainha óbvia.
Desde o desbravar das arroteias do século XIX, ao celeiro da Nação no século XX, o território de Ferreira do Alentejo sempre se afirmou no País como uma potência agrícola.
Volta a fazê-lo agora como o território mais emblemático do regadio alavancado pelo maior projeto hidroagrícola do País – o Alqueva.
A feira nacional da água e do regadio, e, a feira do melão de Figueira dos Cavaleiros, mostram bem a importância local e regional desta atividade.
Os campos hoje são mais verdes porque regados, as culturas hoje são outras porque há água.
Os lagares de azeite, as culturas de amendoal, as uvas de mesa, algumas hortícolas, entre outras, marcam hoje um novo ritmo agrícola com a marca da modernização e de um novo desenvolvimento que parecem estar a ser observados, com desconfiança, pelos velhos e altivos silos da época cerealífera.
Justifica-se muito, e pode fazer-se, uma visita à maior exploração agrícola de Portugal de uvas de mesa sem grainha, ao um lagar, ou aos silos que facultam lá do alto um olhar inolvidável sobre a paisagem da grande planície.
O Património histórico e cultural está em razoável parte estudado e em geral preservado.
Vale pena visitar o centro histórico, a praça central da vila, a biblioteca e o museu.
Também ir à exclusiva fábrica de mobiliário tradicional alentejano, com a sua pintura manual de temática florística e cores fortes, que talvez justifique uma compra, porque não?
Na vila destaca-se a capela do Calvário com a sua forma original, redonda, cravada de pedras, da invocação de Santa Maria Madalena, por baixo de um céu verdadeiramente azul.
Como diz uma moda – “Alentejo não tem sombra / senão a que vem do céu”, como impressivamente registou o nosso inspirado fotógrafo.
Desfrutando todo o território recomenda-se passagens por Abegoaria, Gasparões, Fortes, Olhas, Aldeia de Ruíns, com a sua microrealidade onde, ‘à outrance’ nesta região, temos a marca do minifúndio.
Na realidade, um território diverso, que passa ainda pela povoação de Canhestros marcada pela transição para o litoral e as ‘terras de areias’ ou, no outro extremo, Alfundão, terra típica marcada pelo ritmo lento e introspetivo do Alentejo interior.
Terminamos na Vila, a sede do município, com equipamentos culturais e desportivos, cobertos e ao ar livre, piscina de água quente e com aprazíveis lugares como o jardim público ou a grande piscina pública, com o seu vasto relvado, ambas com esplanadas convidativas, ou, finalmente, a sair para o sul – aqui pontifica sempre o sul! – o parque de lazer da fonte nova, com o seu circuito de manutenção, integrado numa vasta área verde.
Voltar. Voltar a Ferreira do Alentejo. Voltar sempre!
Um bom momento é a feira de setembro, tradicional, velhinha de séculos, que continua a ser o ponto de encontro anual de muitos ferreirenses espalhados por todos os cantos do mundo.