Carismático e nada discreto, no passado era fácil encontrá-lo no Cairo, no restaurante La Trattoria, no bairro de Zamalek, onde tantas vezes se encontrava com o grande amigo Omar Sharif. Em 2006 foi incluído na lista dos 100 Homens Mais Influentes do Mundo pela Revista Time graças, na sua opinião, “à coragem, às coisas que fiz no mundo”. É o egiptólogo mais famoso do mundo, figura proeminente na ciência, mas também uma celebridade internacional que se dá com a realeza não apenas de há milhares de anos, mas também da actualidade.
É internacionalmente conhecido como a figura-chave da egiptologia contemporânea, mas este homem determinado, extremamente directo, incisivo e muito inteligente que ocupou cargos governamentais assumindo um poder e um papel incontornáveis na arqueologia não nasceu apaixonado pela permanente descoberta da História que a sua profissão representa. A Travel & Safaris esteve com ele aquando da sua presença em Portugal, na Universidade Nova de Lisboa, para a palestra Recent Discoveries about the Pyramids, Tutakhamun, and the Golden City, organizada em conjunto com a Embaixada do Egipto em Portugal, no âmbito dos 50 anos de relações diplomáticas entre os dois países.
O evento iniciou-se com a exibição de um vídeo onde se observam momentos verdadeiramente especiais que se percebe multiplicarem-se na vida de Hawass e para si não constituírem novidade. Os monumentos, a História, os segredos, a riqueza e as personagens que povoam o imaginário do Egipto Antigo não são para ele um mistério insondável, mas eventualmente um desafio que abraçou há cerca de 50 anos, quando iniciou a carreira que o tornou famoso e que terá descoberto como que por acaso ou, quem sabe, talvez o tenha encontrado e ele.
Uma paixão encontrada quase por acaso
Nascido em 1947, em Abeedya, uma pequena aldeia próxima de Damietta, no norte do Egipto, Zahi Hawass começou por considerar tornar-se advogado, mas o Direito aborrecia-o. A diplomacia também o atraíra e ainda admitira fazer carreira no Ministério do Turismo ou em Cinema, mas o Cairo já reclamava para si este homem que, um dia, num sítio arqueológico, teria a oportunidade de fazer uma descoberta que daria início a uma verdadeira relação de amor – e acesa paixão – com o passado do país onde nasceu. Numa quinta-feira, ao aguardar em pleno deserto para regressar de fim-de-semana a casa, é chamado ao local de escavação. Passam-lhe um pincel para as mãos e pedem-lhe que colabore. Quando, cerca de meia hora mais tarde, uma estátua começou a revelar-se entre a areia, Zahi sentiu uma voz dentro de si que ainda hoje afirma ter-lhe dito “Encontrei a minha paixão! Encontrei a minha paixão! É a Arqueologia.” Logo a seguir apercebeu-se que estava apaixonado por uma ciência que desconhecia e, portanto, inscreveu-se na Universidade do Cairo, na Faculdade de Arqueologia, formando-se em Egiptologia. “Desde que desenterrei a primeira estátua que sou apaixonado pela arqueologia.” Em 1990 descobria a sepultura de um anão chamado Perniankhu que integrava a corte de Quéfren, tendo sido ali encontrada uma estátua de basalto (e que Hawass caracteriza como uma obra prima daquele período). Quando a segurou, o arqueólogo viveu “um dos momentos mais bonitos da minha vida. Foi como se estivesse a pegar no meu primeiro filho”, contou à Revista New Yorker, em Novembro de 2009.
A voz do Egipto
De origens humildes, talvez tenha herdado do pai a resiliência. Um orgulhoso agricultor, terá morrido quando Zahi tinha apenas 13 anos, deixando seis filhos entregues apenas à mãe. Zahi era o mais velho e terá evidentemente cumprido um percurso tudo menos fácil, mas sobretudo de uma enorme determinação e rasgo de asa. Entre 1969 e 1974 trabalhou como inspector de antiguidades em sítios arqueológicos percorrendo todo o Egipto e quando foi aceite como bolseiro para realizar o doutoramento, em 1980, já trabalhava como inspector-chefe das Grandes Pirâmides. Em 1987 regressava da Universidade da Pensilvânia com uma dissertação intitulada As Instalações Funerárias de Quéops, Quéfren e Miquerinos No Império Antigo (The Funerary Establishments of Khufu, Khafra, and Menkaura During the Old Kingdom). “Regressei como um verdadeiro académico”, tornando-se rapidamente o director-geral dos Monumentos de Gizé, Sakara e do Oásis de Bahariya. Em 1998 tornou-se subsecretário do estado dos monumentos de Gizé e quatro anos mais tarde ocupava já o cargo de secretário-geral do Concelho Supremo de Antiguidades, concentrando-se no restauro e na preservação dos monumentos, a par com a formação de egiptólogos nacionais.
Aos 77 anos, e com uma carreira verdadeiramente invejável, se lhe perguntamos que conclusão tira de todos estes anos de trabalho e de experiências absolutamente fantásticas, afirma acreditar que é o público quem deverá avaliá-lo, “tanto no Egipto como no estrangeiro” e adianta acreditar ser considerado “o guardião dos monumentos egípcios”, o que o deixa feliz. Ao Jornal Sol dizia na entrevista publicada em 19 de Fevereiro “Sou o único arqueólogo egípcio que passou por todos os patamares, desde o mais baixo. Fui assistente, inspetor, inspetor-chefe, diretor, diretor-geral, subsecretário de Estado, secretário de Estado, vice-ministro e ministro. Sim, e viajei muito. Não trabalhei só num sítio. Trabalhei em Abu Simbel, Kom Ombo, Edfu, Luxor, Minia, Alexandria, em todo o lado. No Alto, no Baixo e no Médio Egipto e por isso adquiri um vasto conhecimento. Quando eu era jovem, costumava dizer que a voz da egiptologia era estrangeira. Se ligasse a televisão, só ouvia estrangeiros a falar sobre nós. Se fosse a uma livraria, não encontrava um único livro escrito por um egípcio. Eu mudei isso, tornei-me a voz do Egipto. E muitos estrangeiros ficaram aborrecidos. Outros ficaram felizes. Na verdade, não quero saber. A única coisa que me interessa é que sou o guardião dos monumentos egípcios.” À Travel & Safaris adiantou “Publiquei muitos livros em diversas línguas e também fiz grandes descobertas ao longo da vida. Realizei conferências em todo o mundo. Em breve viajarei para os EUA para mais 33 palestras em 33 cidades e ainda para o Canadá. Fico feliz por partilhar estas aventuras com o público e ver que o faço feliz. Fico feliz com isto.”
Revelar os segredos da areia
De Portugal conhece pouco, só tendo viajado até terras lusitanas duas vezes. “Nunca tenho tempo para passear. Doutorei-me pela Universidade Nova e agora vim a convite do embaixador do Egipto para dar esta palestra e para promover o turismo no Egipto. Vim para promover o turismo e para vos dizer que o Egipto é um país seguro. O Egipto cativa o coração de quem o visita; trata-se de um país absolutamente deslumbrante. Temos muitos visitantes, mas precisamos de mais. As pessoas precisam de saber que se trata de um país seguro. Assistem à guerra em Gaza ou no Líbano e pensam no Egipto, mas o nosso país está muito longe de tudo isto. Visitá-lo é uma experiência muitíssimo rica. Escrevi um livro (Zahi Hawass’ Secret Egypt) onde explico que podemos visitá-lo onze vezes e ficar ainda com muito por ver. Temos os percursos usuais, em que visitamos as pirâmides de Gizé e de Sakara e fazemos o cruzeiro de Luxor até Assuão. Temos os maravilhosos oásis, os palácios, o Cairo islâmico, o copta, o judeu, os monumentos do Médio Egipto que poucos visitam… Temos lugares extraordinários no Sinai… há sítios incríveis e podemos, de facto, viajar onze vezes para lá sem chegarmos a visitar tudo e tornando-se necessário regressarmos uma 12ª vez.”
À medida que se vai entusiasmando, este homem que surge perante uma plateia cheia vestido com um elegante fato, pose descontraída e um à-vontade que denuncia uma elevada autoconfiança, vai revelando a sua alma e a verdadeira natureza. De repente, as calças de ganga, os casacos denim e sobretudo o chapéu à Indiana Jones parecem fazer-lhe justiça correspondendo muito mais à sua índole um pouco frenética que nunca se detém e a uma natureza aventureira que não lhe permite poupar esforços relativamente aos projectos em que se envolve. “As minhas escavações revelam os segredos da areia que ajudam a escrever a história. Visito-as todas as semanas para ver o que se passa e dar instruções.”
A revolução, a inveja, a queda…
A National Geographic Society nomeou-o explorador residente em 2001, uma honra que partilhou com a primatóloga Jane Goodall, o cineasta James Cameron e os paleontólogos Meave e Louise Leakey. Escreveu livros que se tornaram best-sellers e, de acordo com um artigo publicado em Junho de 2013 pela Smithsonian Magazine, chegou a cobrar entre dez e 50 mil dólares por palestra. A exposição itinerante que organizou com 50 artefactos do Museu Egípcio (Museu das Antiguidades Egípcias) intitulada Tutankhamun and the Golden Age of the Pharaohs arrecadou 110 milhões de dólares para o Egipto durante a sua digressão por sete cidades da Europa e dos Estados Unidos, tratando-se de uma das exposições mais lucrativas de todos os tempos.
O percurso de Hawass não foi, no entanto, isento de momentos difíceis. Aquando da revolução, quando os protestos contra o Presidente Mubarak irromperam na Praça Tahrir, em Janeiro de 2011, o homem que decidia quem, como, quando e onde se podia realizar escavações no Egipto, que percorreu o mundo a dar palestras, a figurar em programas de televisão e numa constante publicação de livros e artigos tornou-se alvo de duras críticas. Os manifestantes chamaram-lhe “o Mubarak das Antiguidades”, acusando-o de corrupção. Em Abril seguinte foi condenado a um ano de prisão em virtude de um alegado caso de manipulação de concursos para contratos com o Museu Egípcio, no Cairo. A sentença foi posteriormente anulada, mas em Julho daquele ano, Hawass foi finalmente obrigado a abandonar o cargo. A este propósito, diria em Junho de 2013 à Smithsonian Magazine: “Tinha muitos inimigos, os inimigos do sucesso. São os amigos do deus Set, o deus do deserto e do mal no Antigo Egipto. Foi um ano turbulento. Só sinto falta das minhas escavações. Não estou a soluçar, nem a chorar. Porque haveria de chorar? Nunca! Nunca na minha vida estive deprimido.”
Apesar de possuir uma personalidade incontestavelmente dura e nada fácil, Zahi Hawass acabou por ver reconhecido o seu incontornável valor. A reconhecida egiptóloga, investigadora e professora universitária paquistanesa radicada no Egipto Salima Ikram apoiou-o, destacando a sólida base dos seus conhecimentos e a sua inegável resistência já em 2009 à Revista New Yorker: “Ele está a fazer em dez anos o que normalmente demoraria 50”. Era óbvio que também o mundo académico nutria já uma boa dose de inveja no que respeitava ao seu dinamismo, iniciativa e sobretudo o seu poder. “Domina o universo dos faraós de 30 dinastias e todos os seus sarcófagos e espólio funerário e ao seu cuidado tem ainda as ruínas dos exércitos de Alexandre, Marco António e Napoleão”, lia-se no The Guardian, em Novembro de 2003. Hawass tem perfeita consciência da sua posição naquele mundo. Ainda na entrevista publicada na Revista New Yorker, em 2009, afirmava “Acho que o que fiz foi demasiado para as pessoas no Egipto. Acho que não conseguem suportar tantas mudanças. Não conseguem compreender, consideram-me demasiado poderoso, mas não o sou. Não quero ser demasiado poderoso. Quero fazer qualquer coisa pelo meu país.”
E a verdade é que Hawass representa, sem dúvida, um portento de determinação. Na infância ultrapassou o medo do escuro e ao longo de todos estes anos sobreviveu a um ataque cardíaco, quase foi electrocutado e depois de um burro pisar acidentalmente um buraco no Oásis de Baharyia deu início à escavação do que viria a ser conhecido como o Vale das Múmias Douradas. Sabe o que é tocar numa peça que permaneceu escondida durante 40 séculos e apesar de os franceses, os ingleses, os alemães e os americanos terem concebido a egiptologia, a verdade é que foi Hawass quem reclamou esta ciência para os egípcios. Actualmente “têm acesso a toda esta cultura e visitam os nossos museus. Há famílias inteiras que se deslocam ao Alto Egipto só para visitarem a sua história; vejo que se interessam bastante pelos seus monumentos.
Actualmente a trabalhar como egiptólogo independente supervisionando as próprias escavações em Sakara e em Luxor e ainda no Projecto Scanpyramids, rescindiu um contrato com a National Geographic que lhe rendia 200 mil dólares por ano após surgirem questões sobre um eventual conflito de interesses. Como chefe das antiguidades, Hawass administrava muitos dos sítios que a National Geographic visitava nos seus programas de televisão e em outros projetos, pelo que preferiu afastar-se. Também após a revolução abandonou um acordo com uma empresa americana para lançar a sua própria colecção de roupas que o New York Times descreveu como “uma linha de calças cáqui robustas, camisas de ganga e casacos de pele cuidadosamente usados” que, segundo o catálogo, pretendia evocar “a idade dourada da descoberta do Egipto no início do século XX.” Ficou o chapéu ao estilo de Indiana Jones, cujas réplicas podem ser adquiridas no site de Hawass e cujos lucros revertem inteiramente para um hospital oncológico pediátrico egípcio que fornece cuidados gratuitos inspirando-se no modelo do St. Jude Children Research Hospital.
Resgatar obras nacionais e preservar o que resta
O resgate não apenas da história como de alguns artefactos nacionais que se encontram no estrangeiro são também uma bandeira de Hawass. “Consegui a devolução de seis mil artefactos e, entretanto, fiz duas petições. Uma para alcançar a devolução da Pedra de Roseta, que se encontra no Museu Britânico, e também o Zodíaco de Dendera, que está no Louvre. A segunda petição tem como objectivo trazer de volta o busto de Nefertiti, que está em Berlim, no Neues Museum. Esta petição já foi assinada por 300 mil pessoas (estrangeiras e egípcias). Quando contar um milhão de assinaturas pedirei oficialmente que as três peças sejam devolvidas e exibidas no Grande Museu Egípcio, em Gizé.” Caracterizado como teatral, apaixonado e controverso, Hawass não receia a exposição face os objectivos que se propõe alcançar. Em 2009, exigiu que o Louvre devolvesse ao Egipto cinco pinturas murais em calcário que tinham sido adquiridas pelo museu em 2000 e 2003 numa galeria e num leilão após serem roubadas de um túmulo em Luxor, na década de 1980. Quando o diretor do museu o ignorou, Hawass bloqueou uma escavação patrocinada pelo Louvre em Sakara. “Foi como uma bomba”, contou à Smithsonian Magazine. “Às 8h45 da manhã, estava a dar uma palestra quando Mubarak me ligou. ‘Zahi, o Sarkozy acabou de me telefonar, disse que suspendeste o Louvre. O que aconteceu?’ Expliquei-lhe, e ele disse: ‘O que fizeste foi perfeito.’” O Louvre devolveu as peças em 2009. “Esta devolução tornou-se um símbolo em todo o lado.”
Hawass provavelmente terá feito mais do que qualquer outra pessoa para atrair a chegada de novos visitantes estrangeiros. Os seus programas de televisão, as visitas aos museus, as escavações de grande visibilidade e a reabilitação de sítios antigos “tornaram a egiptologia dinâmica”, afirmou o amigo de longa data Rainer Stadelmann, antigo diretor do Instituto Arqueológico Alemão no Cairo. Contudo, o legado mais importante que Hawass deixará também inclui esforços de conservação. Em Fevereiro deste ano dizia em entrevista à RTP1 que “o país não está a saber conciliar aquela que é uma das mais importantes atividades económicas do Egito com a preservação dos monumentos”, alertando que, “caso não haja medidas de proteção e continuem a entrar milhares de turistas nos sítios arqueológicos, dentro de 100 anos os túmulos e monumentos do Vale dos Reis poderão estar completamente arruinados.” Referiu o impacto da pressão urbana, recordando que as pirâmides estão praticamente “na baixa do Cairo”, e defende que, em determinados casos, como os túmulos de Tutankhamon, Nefertari e Seti, os turistas deviam visitar réplicas e não os locais originais, sob pena do desaparecimento daqueles.
O melhor da carreira, do Egipto e os projectos actuais
Como momento mais alto da sua carreira, Hawass elege a entrada no túmulo de Tutankhamon. “Quando abri o sarcófago e olhei para Tutankhamon foi espantoso, foi mágico. Íamos fazer um exame à múmia e estar frente-a-frente com ele foi incrível. Detectámos que tinha uma fratura na perna esquerda que tinha sido causada por um acidente que sofrera dois dias antes de morrer. Agora estamos a estudar se terá desenvolvido uma infeção. Se assim se verificar, anunciarei que morreu em virtude de esse acidente.”
No Egipto, recomenda a visita aos três museus: O Grande Museu Egípcio, que começou a construir em 2002 e que estava revisto inaugurar em 2017, mas já na altura planeava construir dois museus além do que ainda persiste no Cairo (Museu Egípcio do Cairo) e que Hawass define como ícone da arte egípcia. “Quando pensei no Museu Nacional da Civilização Egípcia, pensei em múmias. Se não houvesse um herói neste museu, ninguém o visitaria e por isso, com as múmias, tornar-se-ia muito mais atraente. “Ninguém virá ao Egipto sem visitar as múmias do Museu Nacional da Civilização Egípcia e Tutankhamon no Grande Museu Egípcio ou a colecção de arte do Museu Egípcio do Cairo.” O Grande Museu Egípcio – que inaugura oficialmente a 3 de Julho – “é um museu espantoso, um espaço verdadeiramente cultural e educativo. A barca funerária de Quéops foi transferida para lá, reservámos duas galerias de grandes dimensões para Tutankhamon, temos a grande escadaria, com estátuas dos faraós a dar as boas-vindas a quem chega…” A sua maior paixão parece, contudo, estar ligada às pirâmides. Se lhe perguntamos qual o local secreto que mostraria a um amigo próximo, responde a sorrir: “Oh, os meus lugares secretos… não é segredo para ninguém… os dois lugares mais bonitos e que mais aprecio são as pirâmides de Gizé e Luxor porque foi ali que fiz muitas descobertas.” Já em 2009, o egiptólogo descrevia Gizé como “um lugar próximo do meu coração”. E arranca com a descrição das suas mais recentes descobertas. “Estou a trabalhar em Gizé, Sakara e Luxor. Encontrámos duas câmaras ocultas dentro da Grande Pirâmide. São grandes. Através de análises de ADN, também estou a fazer investigações sobre as múmias da rainha Nefertiti e da sua filha AnkhesenAmon, e ainda as causas da morte de Tutankhamon, como referi anteriormente. Em Sakara, estou a escavar em busca da nova pirâmide que apresentei no documentário da Netflix, a pirâmide de Huni. Em Luxor, no Vale dos Reis, estou envolvido em cinco escavações. Tudo ao mesmo tempo, em locais distintos, com equipas sob a minha coordenação. Procuro o túmulo da rainha Nefertiti e de outros reis desaparecidos. Também descobri a Cidade Dourada, uma das mais importantes descobertas arqueológicas, e que foi considerada a principal descoberta mundial de 2023. Neste momento continuamos a escavá-la. Até agora têm ocorrido acontecimentos de grande relevância, o que me leva a afirmar que 2025 será o ano mais importante da minha carreira na arqueologia.” O entusiasmo espelhado nos olhos do arqueólogo à medida que reflecte na importância das suas descobertas é evidente, acelerando-se o ritmo das suas descrições, bem como o raciocínio que vai partilhando. “Descobri a Cidade Dourada de Aton completamente por acaso. Chamavam-lhe ‘A Deslumbrante Aton’ e trata-se da maior cidade encontrada até agora. Foi criada por Amenófis III, o Deslumbrante Aton, que era o pai de Akhenaton. Portanto, quando Akhenaton constrói Amarna (para onde desloca a capital do império) dedica-a ao pai, Amenófis III, que era o próprio Aton, Ramsés IV tê-la-á coberto de areia para construir um templo que nunca chegou a existir e é desta cidade que são provenientes grande parte dos objectos encontrados no túmulo de Tutankhamon…”
Um profissional que não dispensa o emprego das novas tecnologias nas suas investigações, Hawass tem já um historial de recurso a infravermelhos, ultrassons e 3D, por exemplo na Grande Pirâmide. As análises com base na sequenciação do ADN permitiram-lhe afirmar ter descoberto a família de Tutankhamon (Akhenaton como pai, Amenófis III como avô e Tié como avó) e ainda a causa de morte de Hatshepsut (cancro), demonstrando assim que Tutmósis III não ordenou a morte de Hatshepsut nem a destruição dos seus monumentos, estabelecendo como mais provável a hipótese de ter sido o povo o autor da eliminação de tudo o que estivesse ligado à rainha que, contrariamente ao que era habitual, governou como faraó. “Eles não gostavam que uma rainha se comportasse como faraó, que era um título reservado apenas a homens.” Perante o entusiasmo, o drama e a entrega com que fala sobres estes temas, será fácil perceber porque é que este homem cujo temperamento é lendário não é capaz de fazer férias. A ideia com que se fica é que as suas férias correspondem aos projectos em que se envolve. “Para me divertir gosto de ver um bom jogo de futebol. No passado a minha equipa teve um bom treinador português, o Manuel José, de quem gosto muito e que é adorado por todos os egípcios.” E não revela muito mais… contando como quem acabou de cometer uma partida que, pronto, “à sexta-feira tiro o dia para estar com a minha neta de seis anos.” E depois acrescenta “e vejo filmes” (sabemos à priori que aprecia muitos os velhos westerns) “e vou ao ginásio todos os dias!”
